LAR DE RIBEIRINHOS, ILHAS DE BELÉM OFERECEM ATRAÇÕES TURÍSTICAS POUCO EXPLORADAS
BELÉM - Em tempos de globalização, o visitante de primeira viagem percebe, rapidamente, que Belém respira autenticidade. Como uma metrópole de aproximadamente 1,4 milhão de habitantes, entretanto, não deixa de ter problemas típicos de nossas grandes cidades. A diferença — e atrativo turístico — é estar no meio da gigantesca floresta amazônica e apresentar, entre as tantas “Amazônias” brasileiras, uma personalidade para chamar de sua.
Na contramão da tradição, Belém chama a atenção pela rápida urbanização. As torres, conjuntos de prédios com dezenas de andares, se multiplicam por vários bairros da cidade. Os shoppings se espalham e têm seus corredores lotados nos fins de semana. Nos bastidores das mudanças, entre as 100 maiores cidades brasileiras, a capital está em 95º em saneamento básico, segundo o Instituto Trata Brasil. As faces do crescimento desordenado são trânsito e violência, o que exige atenção do visitante.
Barquinhos que fazem travessia entre ilhas são chamados de popopôs - Mariana Alvim
E, para além da cidade e dos pontos turísticos mais conhecidos, existem tranquilas e inexploradas opções.
Belém é rodeada por 18 ilhas, lar dos ribeirinhos e de uma natureza ainda preservada. Um dos oito distritos da capital, Icoaraci, tem a função de resguardar a cultura local, abrigando o maior polo de produção de cerâmica marajoara do país. É dali, inclusive, que saem os popopôs — aquelas pequenas embarcações, cujo nome vem do barulho do motor — para Cotijuba, que oferece praias de água doce. E, é bom lembrar, desertas nos dias úteis.
A maioria das ilhas de Belém não recebe visitantes, servindo como moradia e subsídio dos ribeirinhos. Mais pró
ximas à cidade, estão a Ilha do Combu, frequentada por belenenses nos almoços de fim de semana, e a Ilha dos Papagaios, onde se pode observar uma bela revoada de aves ao amanhecer. Para os que dispõem de mais tempo, há ainda as mais distantes Mosqueiro e Outeiro.
REVOADA DE PÁSSAROS NA ILHA DOS PAPAGAIOS E ALMOÇO NO COMBU
manhecer com revoada de papagaios é passeio pouco conhecido - Amazon Star Turismo / Divulgação
Ainda é madrugada, e o viajante dorminhoco pode achar que participar de um passeio com início às 4h30 não vale a pena. Mas vale. A visita à Ilha dos Papagaios é uma ótima — e desconhecida — oportunidade de ver um pouco da natureza em seu esplendor. Entre os meses de janeiro e setembro, milhares de papagaios da espécie Amazona amazonica saem em revoada da pequena ilha de 3,5 km² ao amanhecer, só voltando no fim do dia para dormir. No resto do ano, a maioria das aves deixa o local para se reproduzir.
O passeio de R$ 150 oferece, com acompanhamento de um guia, o transporte até a ilha. Isto envolve o transfer até um porto e a travessia de barco pelo Rio Guamá. Nesta passagem, a transição entre cidade e natureza fica evidente: aos poucos, os barulhos e luzes de Belém vão ficando para trás, dando lugar ao silêncio e aos sons da floresta. Por incrível que pareça para uma cidade tão quente, a temperatura também muda, a ponto de as agências recomendarem que os turistas levem um casaquinho.
Quando o barco vai se aproximando da ilha, após uma travessia de cerca de 25 minutos, já é possível escutar os sons emitidos por pássaros — e a partir daí, basta esperar o amanhecer para vê-los. Voando quase sempre em duplas, os papagaios partem da ilha progressivamente.
Aqueles que demoram a sair ajudam a compor a visão, fazendo pequenos voos nas copas das árvores.
— Eu não entendo porque pouca gente faz este passeio. Os gringos, quando vêm aqui, ficam loucos. Mas lá mesmo em Belém, pouca gente conhece a Ilha dos Papagaios — lamenta o guia Edilson de Assunção.
Além das aves, as luzes do amanhecer adicionam beleza à incursão ao se refletirem nas águas, na mata e nos prédios da Belém que ficou para trás. A Ilha dos Papagaios, casa de cerca de oito famílias, é cercada por outras e, por isso, garante ao visitante um pequeno vislumbre da vida dos ribeirinhos. Pequenas canoas e barcos carregam frutos e peixes para a cidade.
A Ilha dos Papagaios é residência para poucas famílias - Mariana Alvim
No fim do passeio, o barco retorna a Belém, passando pela ilhas vizinhas e pelos furos e igarapés que as cortam — os primeiros seriam canais com ligação com os grandes rios e os segundos, pequenos canais “sem saída”, explica Edilson. Este é mais um momento do passeio que permite que o turista observe a rotina dos moradores das ilhas, que se banham à beira de suas casas e circulam com seus barquinhos para diferentes atividades — existe ali uma igreja evangélica ribeirinha.
Ao contrário da Ilha dos Papagaios, uma de suas vizinhas, a Ilha do Combu, é amplamente conhecida e frequentada pelos belenenses — e também bem mais extensa, com cerca de 15 km². É para ela que famílias e grupos de amigos vão nos fins de semana, quando tomam banho de rio ou comem em algum dos cerca de 12 restaurantes do lugar, onde o visitante pode encontrar os ingredientes e pratos típicos da culinária paraense. O mais celebrado entre as opções é o Saldosa Maloca, um negócio familiar à beira do Rio Guamá, que há 33 anos enche em sábados e domingos. Com vista para a cidade de Belém, o restaurante oferece deliciosos pratos, como a caldeirada paraense, com postas de filhote e camarões rosa cozidos no tucupi, e o peixe à moda indígena, com postas de filhote grelhadas, que são servidas ao tucupi, arroz e farinha d’água.
Mas é ali, na Ilha do Combu, que o turista pode conhecer também os bastidores da culinária paraense. Izete dos Santos Costa, a Dona Nena, sempre viu seus avós e pais cultivando o cacau. Há nove anos, resolveu comercializar alguns produtos feitos com o fruto, como licor e chocolates. Hoje, ela fornece seus artigos gastronômicos para renomados restaurantes de Belém, como o Remanso do Bosque, o Manjar das Garças e o Lá em Casa.
— Não sabia que tinha um tesouro no meu quintal — diz Nena, com sorriso fácil.
A ribeirinha recebe, frequentemente, turistas para um passeio por sua produção, que inclui café da manhã. O tour dura 4h e custa R$ 70. É uma oportunidade de conhecer seu projeto de plantio sustentável e ver de perto plantas nativas como a andiroba, a pupunha, o cupuaçu e a gigantesca samaumeira. Os interessados podem escrever para combuorganico@gmail.com.
Não à toa, a região faz forte investimento na promoção de sua culinária. Em maio, por exemplo, Belém sediou seu tradicional Festival Ver-o-Peso. Em setembro, será a vez do 3º Festival Internacional do Chocolate e Cacau Amazônia e o 13º Flor Pará.
Para chegar aos restaurantes da Ilha do Combu, pegue um popopô. Eles saem todo dia da Praça Princesa Isabel, na Avenida Bernardo Saião, a cada 20 minutos. A travessia dura 15 minutos e custa R$ 5. Fique atento ao horário dos restaurantes: a maioria só abre nos fins de semana.
ILHA DE COTIJUBA: PRAIAS DE ÁGUA DOCE DESERTAS (NOS DIAS ÚTEIS)
Praia Funda, na Ilha de Cotijuba - Mariana Alvim
Uma das poucas ilhas de Belém a oferecer balneários com areia, Cotijuba é repleta deles: em seus 16km² há seis praias. Badaladas nos fins de semana, em dias úteis ficam quase desertas. Para aproveitar um bom banho de rio e a proximidade com a mata, no entanto, é preciso deixar algumas mordomias, digamos, em Belém.
A ilha é rústica no bom e no mau sentido da palavra. As ruas são de terra, e a locomoção é feita a pé, com carroças ou mototáxis.
As opções de alimentação e hospedagem são humildes — mas nesse caso, não se preocupe, um bate-volta a partir de Belém já vale bastante a pena.
Barcos para Cotijuba, os popopôs, saem do Porto de Icoaraci, distrito de Belém. De táxi, a viagem do centro da capital até lá custa cerca de R$ 75 (uma perna). Há também várias linhas de ônibus que fazem o trajeto.
Em Icoaraci, a Cooperativa de Barqueiros da Ilha de Cotijuba oferece transporte diário, a cada hora, das 7h às 18h30. O preço é R$ 15, e o trajeto dura 40 minutos. Na travessia, é comum encontrar comerciantes com produtos locais e moradores carregando sacolas de compras feitas no continente. Repare também na vida ribeirinha.
Para chegar à Vai Quem Quer, é preciso pegar mototáxi ou charrete - Mariana Alvim
A praia mais famosa da ilha é a Vai Quem Quer. Por ser distante do trapiche, os moradores brincam que ela se chama “Vai quem pode”. Para chegar até lá, tem que se aventurar, a R$ 7 uma perna, em uma charrete ou mototáxi, sem capacete — prefira os de cor branca, da cooperativa. O lugar oferece alguns restaurantes e chama a atenção por sua beleza e extensão. Outras boas opções são as praias Funda e da Saudade — mais rústicas, naquele bom e mau sentido da palavra no início do texto.
Para quem preferir não se aventurar em charretes e mototáxis e estiver disposto a caminhar por cerca de 15 minutos, há também as praias do Amor e do Farol — esta é a que tem maior estrutura e é a mais movimentada.
Em qualquer uma das praias, ao seguir as instruções dos locais, você vai ter certeza que está no meio da Amazônia: cuidado com as arraias e com a correnteza. Para a primeira recomendação, entre no rio arrastando os pés na areia para afastá-las; no segundo caso, basta não ir muito para o fundo.
Antes ou depois da visita à Cotijuba, vale a pena conferir a Feira do Paracuri, a alguns metros do Porto de Icoaraci. O distrito é hoje o maior produtor de cerâmica marajoara no país, oferecendo réplicas e releituras modernas da arte centenária e indígena realizada na Ilha do Marajó.
Paracuri, bairro de Icoaraci, reune diversos produtores e o Liceu de Artes e Ofícios Mestre Raimundo Cardoso, em homenagem a um dos expoentes da técnica, morto em 2006. Na feira, artesãos vendem itens utilitários e decorativos a melhores preços do que em Belém.
Fonte: http://oglobo.globo.com/boa-viagem
Fonte: http://oglobo.globo.com/boa-viagem
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